Depois da tempestade, a bonança (????)

Dias atrás estava desesperada. Conflitos de fim de ano e fim de graduação. Felizmente sempre amei ler – pela explosão que isso provoca na cabeça, pela abertura de visão de mundo – e resolvi conhecer outras histórias, reconhecendo a pequeneza da minha.
Há alguns anos já tinha ouvido falar de Gen, pés descalços, a história em quadrinhos de Keiji Nakasawa, leitura obrigatória para quem quer conhecer HQ ou a história das bombas atômicas despejadas sobre o Japão – no caso de Gen, mais especificamente Hiroshima. Bom deixar claro, desde o início, que a história é contada pela ótica de uma criança, mas não é infantil. É profundíssima, inteligente, bem-humorada e ácida.
Bem, não pretendo fazer nenhuma resenha jornalística – isso demanda pesquisa, comparações com outras obras e não estou com muita paciência. Quero, como sempre, falar de mim. Falar de mim em tudo, até quando falo dos outros, quando falo dos livros, filmes e peças que vi.
É que Gen agora é parte de mim. E não há como não ser. É assim com os bons livros, aí é que está a graça, a beleza, a humanidade da leitura. Com o personagem – que sei ser o próprio Keiji Nakasawa, o que, pra mim, aumenta a força da historia – ri loucamente, explodi em lágrimas ou deixei-as rolar mansamente, como quem pensa que a vida é mesmo muito curta e cheia de armadilhas, mas também de boas e belas surpresas.
NUNCA vou esquecer as imagens de keiji. O jeito engraçado que as personagens comemoram, as músicas que as crianças cantavam, nas suas situações mais adversas. O choro, o de-ses-pe-ro. O horror! As pessoas queimadas, com a pele “escorrendo” de seu corpo repleto de larvas. A imagem sempre evocada do pai de Gen, o artesão convictamente antimilirista, de uma retidão de caráter que eu, sinceramente, queria pra mim. Pr´além disso, impressionou demais a relação dos japoneses com a morte – tudo bem, não quero generalizar e tenho de entender o momento por que passavam, em que não havia condições nem para chorar os mortos -: “O que pela alvorada é pele fresca e aveludado, à noite não passa de um saco de ossos”, diz mais ou menos assim o trecho do hino budista. Dos ianques monstros – “a cara vermelha e o nariz pontudo”, no imaginário das crianças que recebiam os chicletes jogados como esmola pelos norte-americanos.
Li em um dia os quatro volumes e no outro dia acordei lembrando de tudo, as imagens dançando na minha mente. Abri os olhos e pensei que o mundo é tanta coisa e eu sou tão pequena; que as pessoas conseguem ser tão boas e tão ruins... podem parecer clichês, mas quando sentidos e entendidos, doem pra caralho em toda sua simplicidade e verdade.
Sem muito tempo pra escrever, meu coração apenas bate mais rápido ao lembrar de tudo isso – sim, lembrar, como se eu tivesse vivido aquilo, pois a literatura tem o poder, penso, de transformar a memória de um em memória e experiência de todos, coletiva. É duro perceber que eu não escrevo tão bem quanto gostaria para compartilhar com todos e todas o que eu vivenciei exatamente com essa leitura, mas fica um quase apelo para que quem quiser pensar o mundo criticamente, pensar a violência e suas causas, a pobreza, a alegria, a superação, leia Gen, pés descalços.
Senti-me pequena e cheia de vida, cheia de responsabilidades para com o mundo e aqueles a quem amo. Contraditoriamente ou não, após a leitura de Gen.

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