Parte de mim II

Porque essa mulher (e tantas outras) mexe comigo.

A minha saudação
Aos que meu insultaram, aggrediram, calumniaram hontem; aos que me injuriaram,aggridem, calumniam hoje; aos que vão me offender, atacar, aggredir, calumniar amanhã
Não costumo responder aos ataques da imprensa. Nunca respondi, e não pretendo responder aos insultos, ás provocações, ás calumnias com que buscam me visar, atravez da independência com a qual defendo as minhas verdades interiores, injurias que nao me attingem.
Ou melhor: emquanto eu estiver no goso das minhas faculdades mentaes e dentro do equilíbrio das idéas em harmonia com o meu caracter, emquanto a minha consciência for o meu único juiz, a benção de luz da minha vida interior - a resposta ao despeito, ao fanatismo, ao sectarismo, ás injurias, ás calumnias, será continuar a pensar e a viver nobremente a coragem excepcional de dizer, bem alto, o que penso, o que sinto, o que sonho, embora toda a covardia do rebanho humano apesar dos escribas e phariseus da moral social.
As criaturas, eu nunca as alvejei pessoalmente nos meus escriptos. Os factos e os seres, delles me sirvo como pretexto para ensaios em torno do problema humano, sob o ponto de vista do meu individualismo, ou "vontade de harmonia", para estudar a psychologia dos homens e das mulheres atrellados ao côche da vida social, para analysar, para escalpellar, para philosophar antes as dores do mundo que fez da vida, tão bella, a perversidade moral, legalmente organizada.
Chovam-me sapos de toda parte: eu os comerei sem repugnancia, com immenso prazer, que os sonhos me saltam da penna, e das mãos, já não cabem no coração a transbordar de Amor para toda essa pobre Humanidade céga de inconsciencia, de fanatismo, de ignorancia, em uma palavra, céga de ambição, e da "vontade de poder". Não me defendo, nem accuso. Nem acceito D. Quixotes. O protesto público de solidariedade de dois ou três amigos verdadeiros, não é a attitude humilhante da defeza: sou um individuo e não uma "dama".
Uma só arma existe bastante forte, fundida no cadinho das verdades cósmicas, uma única apara e resiste aos golpes das aggressões, das ignomínias: é o Amor, é a piedade com qeu olhamos os desatinos de o todo gênero humano, arrebatando no torvelinho louco da civilização industrializada.
Não jogo as mesmas armas ou os mesmos processos por crime de injurias contra os meus inimigos de idéas: armas á minha disposição, atiro-as com desprezo aos pés dos moralistas ou dos duelistas fanaticamente patriotas, que dellas melhor se sabem servir.
Injurias e calumnias não se pagam com dinheiro, nem se resgatam com palavras offensivas, nem se lavam com sangue. A minha concepção da dignidade humana é outra.
As minhas armas são os meus sonhos, é a minha vida subjectiva, é a minha consciência, a minha liberdade ethica, é essa harmonia que canta dentro de mim, e toda a minha lealdade para commigo mesma; e eu não maculo a minha riqueza de vida, o meu thesouro interior, envolvendo-o na mesquinhez e na perversidade das leis dos homens ou misturando-o com dinheiro, essa cousa horrível que corrompe as consciências mais convencidas da sua fortaleza inexpugnável, e as escravisa, acorrentando-as á gehenna do industrialismo, a chocar-se umas contra as outras na engrenagem sórdida da exploração do homem pelo homem."

Maria Lacerda de Moura. A Minha Saudação. O Combate, São Paulo, n. 4824, p. 1, 27.09.1928.

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