Cronos come os filhos que fez com Gaia




O que é o tempo? Não consigo parar de pensar nisso. Seria um grande alívio, certamente; viver sem sofrer com tanta antecedência as fatalidades...

Esses dias estive bastante ocupada. Terminei de ler A Montanha Mágica, livro muito bom, intrigante, que trata do tempo de maneira profunda e belíssima. Engraçado, geralmente choro com livros profundos. Mas é que A Montanha Mágica fala de coisas profundas com certa casualidade, naturalidade, apesar do estilo elegante e classudo de Thomas Mann. Tive vontade de chorar apenas duas vezes; mas isso pelo fato ao qual a narrativa se reportava, não por conta da narrativa, que alias foi o que me impediu de chorar e não aceitar aqueles fatos como “fatalidade” – com o perdão da redundância / trocadilho.

Acontece que agora estou lendo O Encontro Marcado, de Fernando Sabino. E esse é um encontro que estava marcado há anos: desde criança freqüento o sebo do Geraldo com minha mãe. Adorava – como adoro até hoje – me perder no mar de livros. Quantas histórias por ler! Quantas eu nunca chegaria a ler? Quantas a minha imaginação nunca poderia supor? Isso me fascina, essa riqueza da literatura. Pois foi lá no Geraldo que vi pela primeira vez o livro de Sabino. Estava com 12 anos, mais ou menos, e só lia literatura infanto-juvenil. O titulo chamou-me muita atenção e me pareceu que a obra deveria ser gostosa de ler, leve e ao menos tempo profunda, com um quê de amargura e impotência diante das coisas do “destino” – se é que ele existe... mas como é poético pensar em destino! A capa é rosa, melancólica. E a vontade de ler O Encontro Marcado sempre clamava dentro de mim a cada vez que fitava o livro, sempre naquele mesmo armário, no mesmo canto. Incrível! Um dia desses, nem lembrava mais desse livro, estava lá, vendo o que meus parcos recursos me permitiriam adquirir, e o encontrei. Fiquei emocionada. E agora resolvi lê-lo, finalmente, o nosso encontro marcado que estava para algum dia do futuro, sem data alguma.

Não quero escrever tanto aqui sobre o livro em si, até por que nem terminei de lê-lo ainda. O importante é que ás primeiras páginas pensei “É, é bom, mas nem tanto... que pena! Tantos anos de espera!”, mas agora já arrisco dizer que é muito, muito bom, suplanta as minhas expectativas. Fala do tempo também, mas de forma mais pessoal e angustiada (não,não sei se de forma mais angustiada; talvez igual, e não mais) do que A Montanha Mágica. A escrita de Fernando Sabino é crua e um tanto quanto objetiva, mas corta fundo. Fala alto aos meus sentimentos, às minhas inquietações... lembro sempre de uma música – inclusive esses dias citei-a numa conversa – de Renato Russo, é O mundo anda tão complicado, em que ele diz “quero ouvir uma música que fale da minha situação”. E não é assim também com a literatura? Um bom livro fala conosco, comunica sentidos – como ouvi outro dia, e também lembrei hoje, a arte é comunicação de sentidos, em amplo sentido rsrs. A angústia; a sensação de não ter escolhido, mas sim de ter sido escolhido pelo tal “destino”; a inexorabilidade do tempo; o efêmero da existência... Cronos, faz filhos com Gaia e depois os come! Isso é o terror! Isso me arrepia, mas muitas vezes acalma...

Termino o texto por aqui. Tinha muito mais a dizer. Agora sinto de novo como se as palavras “amputassem” os pensamentos meus. Termino o texto sem conclusão – e daí? Não quero concluir nada! Não quero uma vidinha equibilibrada, com tudo bem certinho... Quero me jogar no mundo! Vida é pra gastar!

Outro dia continuo...

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